quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Último Registro: [Ganghwa, 1875 - Incidente do Un'yō]

Por Homura Masato

Estamos a bordo do "Un'yō" o navio de guerra comandado por Inoue Yoshika, rumo à ilha de Ganghwa, na Coreia. O Japão enxerga a Coreia como um ponto estratégico que pode se voltar contra nossa nação, caso a China ou a Rússia tomem controle. Com medo, estamos fazendo o mesmo que os ocidentais fizeram conosco quando seus navios negros chegaram com seu "Tratado" de Kanagawa. Ameaçar e chamar de tratado é fácil quando se é mais forte. Não me arrependo de ter escolhido meu lado naquela ocasião.
O imperador achou por bem levar alguns membros menores da antiga Shinsengumi, desmantelada desde a nossa derrota na Revolução Meiji, para a operação do ''Un'yō''. Imagino que essa seja a definição dele de ironia. Quanto a mim, não é por isso que estou aqui. Não fui chamado para ser bucha de canhão tal qual meus companheiros.
A Armada Milenar me infiltrou nessa operação para investigar ações suspeitas na Coreia. A ilha de Ganghwa noticiou muitos eventos nesses últimos anos que podem ser associados a demônios: mulheres desapareceram das vilas. Homens perderam a vontade de viver, andando a esmo como se fossem um invólucro vazio. Sei quem está por trás disso. Sei como detê-lo.
Foi enviado primeiramente um barco menor, como precaução. A Ilha de Ganghwa foi alvo de diversos ataques estrangeiros na última década, e não sabíamos como eles iam reagir a uma embarcação japonesa. O resultado foi a morte tola de cadetes valorosos da antiga Shinsengumi. O ''Un'yō'' forçou sua entrada, usando seus canhões para silenciar as armas coreanas. Enquanto Inoue bebia comemorando sua invasão, eu bebia em nome de meus camaradas.
Sinto falta de casa, meu filho a essa altura já deve ter 9 anos. Eu não o vejo há 4 . Ele me perguntou, antes que eu partisse, como eu havia perdido o braço. Eu lhe disse que foi lutando para que ele estivesse sempre seguro, e que eu continuaria fazendo o mesmo e por isso precisava partir. Ele então disse para que eu partisse, e que ele protegeria a mãe dele, para que eu lutasse e voltasse logo para casa. Meu filho será um grande membro da Armada Milenar.
Duas noites depois, eu encontro o que procurava. Num bosque cerrado, havia um altar que não fazia muito esforço para se esconder: A lua revelava corpos decompostos em meio aquele altar, parcialmente devorados. Pelas marcas, pelos sinais de luta, eles foram devorados enquanto ainda estavam vivos. Ele aparece, logo em seguida: cabelos ondulados, na altura do ombro, pele branca, no tom próximo ao de um cadáver, olhos negros sem o menor brilho. N'Zhambi, um Loa, um espírito do Vodu. Ligado diretamente a criação, vida e morte, ele se auto proclamou um deus moderno. Nos encontramos brevemente na Europa, dois anos atrás. Depois de um árduo combate, ele me revelou que estava apenas assumindo seu lugar de direito, e que matava apenas para dar uma nova vida a suas vítimas, criando seu exército para tomar o mundo e ser louvado por todos.
Eu saco minha Kotetsu. Aprendi a manejá-la bem, mesmo dispondo de apenas uma mão. Os corpos devorados se levantam com um comando de N'Zhambi. Eu odeio zumbis.
Com alguns movimentos, eu os dilacero, me certificando de causar grande dano em suas cabeças, para que não me incomodem mais. Quando percebo, algo próximo a 25 corpos se estendiam no chão, ao longo do percurso que me separava de N'Zhambi. 
Eu ataco ele com um movimento circular, empunhando a katana ao contrário. Minha lâmina encontra o peito do demônio, e seu sangue jorra sujando minhas vestes. Ele me acerta um chute no peito, e eu caio, tentando rolar. Infelizmente não sou mais tão jovem, e meu corpo demora para se recompor. N'Zhambi aproveita para correr de volta para o altar em que havíamos nos encontrado. Aparentemente ele havia começado um ritual, e agora eu tinha a nítida impressão de que ele o anteciparia devido a minha intervenção.
Resmungando algumas palavras que eu não poderia compreender, o altar brilha numa luz opaca, viciada. Os corpos no chão começam a se decompor mais, como se eles se tornassem energia que N'Zhambi absorvia. Num ato de desespero, eu embainho a espada e utilizo uma técnica complicada de desembainhamento, que arremessa a Kotetsu como uma flecha, perfurando o peitoral de N'Zhambi e o jogando ao chão, inerte, morto.
O membro de apoio da Armada Milenar me encontra algumas horas depois, e me ajuda a dar um enterro digno a todas aquelas vítimas. Fico imaginando qual seria o plano de N'Zhambi, e para que aquele ritual servia. Um jovem coreano surge logo depois, agradecendo por ter sido salvo. Parece que estava sendo mantido vivo para algo relacionado ao ritual também. Ele se despede, mas a falta de brilho nos olhos dele me incomoda. Antes que eu possa alcançá-lo, ele já havia sumido.
Enquanto retorno para o Japão, noto que minha mão treme involuntariamente. As marcas de sangue saem com facilidade de meu quimono, mas não de minha pele, não importa o quanto esfregue ou lave. 
Temo que não serei útil para a Armada Milenar por muito mais tempo.
 
Símbolo de Damballa Weddo - Outro nome de N'Zhambi

Nenhum comentário:

Postar um comentário